domingo, janeiro 29, 2006

Este não é o meu Portugal


Portugal não pode sair dos focos irracionais que sobre ele se centram. Não sei como tudo acabará, como tudo se resolverá; mas sei que cada vez é mais difícil e abafado viver-se no país.

Anunciam-se medidas logo aprovadas pela direita em bloco, que obrigam o governo a celebrar um pacto com os detentores do capital – os empresários sobretudo.

Não que seja contra a iniciativa privada, bem pelo contrário, mas os projectos avançados não se debruçam sobre as condições de vida dos cidadãos, mas sobre a melhoria das condições de investimentos futuros, como respondendo aos eternos anseios dos verdadeiros ajuntamentos capitalistas, em detrimento dos mais carenciados.

A mais rançosa visão sobre a Unidade de Portugal cai sobre nós, enchendo-nos de temor, porque o importante parece não serem os papéis que nos mandam apanhar, mas os que, com desprezo atiram ao chão.

Para esses o importante é que Portugal – quer dizer o seu governo e seja dito de esquerda ou direita – com eles pactue e estabeleça uma nova relação que, dito de passagem tornará a vida mais madrasta e vulnerável para a esmagadora maioria da cidadania nacional.

É vê-los na Assembleia da República, como defendem as suas teses, que sabem ser impróprias de políticas sociais – como eles próprios se anunciam sempre tão preocupados; dói ver e sentir tanto irracionalismo, tanta paixão e tanta incompreensão. Tanta gritaria.

Os debates e o problema já não são novos. Citando frases célebres de antigos governantes dos últimos séculos: “Há que encher Portugal do pior que tenha em si mesmo”, quer dizer bombardeá-lo com o pior da política, quando se diz de esquerda e pratica políticas dignas de diminutas medidas em relação ao povo.

Um certo duque do século XVII teve o desplante de afirmar: “O melhor a fazer é trazer gente nova, porque a que existe não presta”. Ou então aquele militar que disse: “O melhor que se pode fazer por Portugal é castelanizá-lo, porque os portugueses não pensam em português, não falam português nem se conduzem como portugueses. Queiram ou não, seja feito a bem ou a mal. O soldado e o marinheiro portugueses devem ser enviados para o exterior para adquirirem outros hábitos e costumes…devem ser distribuídos por todas as províncias ultramarinas…”

Num de seus livros, um escritor dizia: “O português é uma pessoa sem conhecimentos e assegura ser uma lei da história de Portugal. Para ele não deve haver paz, piedade ou perdão”, resumindo suas frustrações depois das barbáries cometidas; por uns e por outros.

Um outro militar gritou um dia: “Viva a morte” e morra a “inteligência”, diante dum professor universitário e seus alunos em 1936. “Existem cancros no corpo da nação. O fascismo saberá como exterminá-los, cortando a carne, como decidido cirurgião livre de preconceitos e de falsos sentimentalismos”.

É cada vez mais duro e difícil o debate sobre a forma de alcançar os níveis europeus – bastava-nos o espanhol. Mas, o espírito que alimenta o povo é muito parecido a uma lesma. Estamos na União europeia, o exército nada pode fazer e o país alcançou uma quota muito notável de mal-estar, sobretudo social.

Aos que se opõem ferozmente ao progresso do povo português, mais que constitucional, convido-os a que se acalmem, que não ressuscitem os fantasmas de antanho, que pensem que se os portugueses estão mal; para eles próprios será cada vez mais nocivo. Embora também para os portugueses em geral.

Que será de Portugal? Repudiam-se os portugueses, boicotam-se seus produtos; querem que deixem de ser portugueses? Mas, um Portugal sem portugueses não o será mais.

Este é um Portugal desafortunadamente superado. Em qualquer caso, não é o meu.